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O TEMPO jornal de fato

MINO CARTA, JORNALISTA NA LITERALIDADE

Prof. Dr. Adelcio Machado dos Santos Jornalista (MT/SC 4155)

Em primeiro lugar, ao se falar de jornalismo no Brasil, poucos nomes evocam um vínculo tão íntimo entre palavra e militância quanto Mino Carta. Figura central na criação de veículos como Quatro Rodas, Jornal da Tarde, Veja, Isto É e Carta Capital, o jornalista italo-brasileiro construiu uma trajetória marcada não apenas pela ousadia editorial, mas por um compromisso visceral com a linguagem. Sua obra, seja no campo do jornalismo ou da literatura, revela um profissional que entende a escrita como instrumento de combate, reflexão e, sobretudo, como espaço de resistência à mediocridade e ao cinismo.

Na literalidade de Mino Carta, encontramos redação que repta a impessoalidade do jornalismo tradicional. Ao contrário do que prega o manual clássico, seu texto não disfarça o autor. Há, em cada linha, a presença inconfundível de um sujeito: indignado, culto, irônico, e, sobretudo, profundamente comprometido com uma visão de país e de mundo. Essa presença do “eu” não é vaidade, mas posicionamento. Em tempos de neutralidade fabricada, Mino Carta faz do engajamento sua precípua virtude, afirmando que todo jornalista verdadeiro deve, antes de tudo, tomar partido da verdade — posto que incômoda.

Seu estilo, denso, por vezes hermético, sempre elegante, exige do leitor um pacto que vai além da informação. Ler Mino, outrossim, implica decifrar um código em que política, história, literatura e filosofia se entrelaçam. Ao trazer à tona referências que vão de Dante Alighieri a Gramsci, ele impõe uma leitura crítica do real, recusando-se a simplificações. Em seus editoriais na Carta Capital, por exemplo, a análise dos fatos políticos raramente se limita ao factual. Cada texto é uma miniatura ensaística, uma tentativa de compreender os subterrâneos da notícia, de revelar o que se oculta por trás da aparência.

Por conseguinte, essa escolha estética e ética o afastou de amplas audiências, mas o aproximou de leitores fiéis. A Carta Capital, fundada por ele em 1994, nunca teve o alcance comercial de outras revistas semanais, mas ocupou um espaço singular no cenário da imprensa brasileira: o da crítica contundente ao modelo neoliberal, da denúncia à criminalização da política, da defesa intransigente do Estado Democrático de Direito. Numa era em que a imprensa frequentemente se curvou aos interesses do mercado e aos imperativos da publicidade, Mino Carta insistiu em um jornalismo que se quer formador, e não apenas informador.

No entanto, se o jornalismo de Mino se confunde com sua visão de mundo, sua incursão na literatura aprofunda ainda mais essa relação. Autor de romances como O Castelo de Âmbar e Aos Leões, ele utiliza a ficção como forma de exorcizar os fantasmas de sua história pessoal e coletiva. Em suas obras, há ecos da Itália de sua infância, da São Paulo dos anos 1960, da imprensa que ajudou a moldar e da política que testemunhou de perto. A linguagem, aqui, é mais livre, mas não menos crítica. Ao transitar entre o jornalismo e a literatura, Mino reforça a ideia de que ambos os campos são faces de uma mesma busca: a verdade como horizonte, ainda que inalcançável.


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            Destarte, em tempos de “fake news”, algoritmos e desinformação em massa, o legado de Mino Carta torna-se ainda mais relevante. Sua insistência na integridade do texto, na inteligência do leitor e na responsabilidade social do jornalista é um antídoto contra a superficialidade dominante. Em um cenário em que a velocidade muitas vezes atropela a reflexão, sua escrita desacelera, exige pausa, convida ao pensamento.

Em epítome, Mino Carta é jornalista na literalidade não apenas porque escreve com apuro estilístico, mas porque faz da palavra escrita sua forma de existir no mundo. Sua trajetória é um testemunho do poder do texto como instrumento de crítica, memória e transformação.

Por final, se a história do jornalismo brasileiro é repleta de contradições, apagamentos e cumplicidades, a presença de Mino serve à guisa de lembrança de que é possível, e necessário, redigir contra a corrente.

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