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Prof. Dr. Adelcio Machado dos Santos Jornalista (MT/SC 4155)
Em primeiro lugar, entre os nomes mais respeitados da literatura brasileira contemporânea, Luis Fernando Veríssimo ocupa uma posição singular. Não apenas por sua vasta obra que transita com leveza entre o humor, a crônica do cotidiano e a crítica social, mas também por seu modo sóbrio, sensato e, acima de tudo, justo de enxergar o mundo. Sua escrita, marcada pela inteligência refinada, empatia e uma ironia sutil, nunca recai no deboche cruel ou na farsa vazia. Ao contrário, Veríssimo oferece ao leitor uma lente através da qual é possível rir das mazelas humanas sem desprezá-las, entender o absurdo da realidade sem se afastar dela. Destarte, construindo uma carreira coerente e um discurso equilibrado, Luis Fernando Veríssimo revelou-se, ao longo das décadas, não apenas um redator brilhante, mas também um sábio e justo observador da vida brasileira.
De outro vértice, filho do também consagrado escritor Erico Veríssimo, Luis Fernando desde cedo esteve em contato com o universo da palavra escrita. No entanto, longe de se apoiar no prestígio do pai, construiu seu próprio caminho com originalidade e consistência. Ao contrário do tom mais dramático e romanesco que marcou parte da obra do pai, Luis Fernando optou por um estilo mais contido, cotidiano e profundamente irônico. O humor foi, desde o início, uma de suas marcas registradas, mas nunca um humor simplista ou descompromissado. Em suas crônicas e contos, há sempre uma camada subjacente de crítica social, de olhar atento às contradições da classe média brasileira, às hipocrisias políticas, aos desencontros familiares e às obsessões banais da vida moderna.
Destarte, e justamente nesse olhar aguçado, porém gentil, que reside sua sabedoria. Veríssimo não busca ensinar ou doutrinar o leitor, mas convidá-lo a refletir junto com ele. Seu texto não é um púlpito nem um palanque, mas sim uma conversa entre iguais. Mesmo quando se posiciona claramente — e o faz com frequência — contra os absurdos da intolerância, da desigualdade, da violência e do autoritarismo, sua crítica não vem em tom de sermão, mas como um chamado à consciência, sempre sustentado por uma fina ironia e um senso de justiça profundamente humanista. Seu personagem mais famoso, o analista de Bagé, é um exemplo disso: um tipo rude, conservador e machista que, no entanto, é desmontado pela própria lógica interna de suas contradições, revelando, por trás da caricatura, a crítica a um tipo social ainda muito presente na sociedade brasileira.
Ademais disso, o senso de justiça de Veríssimo não se restringe à política. Ele se manifesta também na maneira como o autor retrata o cotidiano. Em suas crônicas mais leves, aquelas que tratam de casamentos, filhos, envelhecimento, futebol ou música, há sempre um esforço em compreender o outro, mesmo que esse outro seja uma versão de si mesmo às voltas com o ridículo da existência. O riso que suas histórias provocam não é de escárnio, mas de reconhecimento. É um riso que conforta, porque aponta que, no fundo, todos estamos no mesmo barco, lidando com as mesmas pequenas tragédias e alegrias, tentando entender um mundo que nem sempre faz sentido.
Igualmente, a sua produção como cronista é uma das mais vastas e consistentes da literatura brasileira. Publicado regularmente em jornais de grande circulação, Veríssimo conquistou uma legião de leitores fiéis, que aguardam suas crônicas como quem espera uma conversa com um velho amigo. E é justamente essa relação afetiva com o leitor que torna sua escrita tão poderosa. Ele não se vale de artifícios estilísticos rebuscados nem de discursos pretensiosos. Sua linguagem é clara, fluida e acessível, sem jamais ser simplória. Ele demonstra, com maestria, que a simplicidade pode ser uma forma de profundidade, e que a verdadeira elegância do texto está na sua capacidade de comunicar, emocionar e fazer pensar.
Outrossim, a sabedoria de Veríssimo se revela também em sua discrição. Em um tempo em que tantos autores buscam a autopromoção constante e o protagonismo em debates barulhentos, ele escolheu o caminho do silêncio ponderado. Raramente aparece em polêmicas públicas, e quando o faz, é com sobriedade e elegância. Sua figura pública é marcada pela modéstia e pela civilidade, qualidades cada vez mais raras num mundo que parece valorizar o grito em detrimento do argumento. Isso, no entanto, nunca significou omissão. Pelo contrário: Veríssimo sempre foi claro em suas posições, defensor intransigente da democracia, da liberdade de expressão e dos direitos humanos. Sua coerência ética talvez seja uma das marcas mais notáveis de sua trajetória.
A justiça, em Veríssimo, é antes de tudo um compromisso com a humanidade. Em seus textos, não há espaço para o cinismo ou para a indiferença. Mesmo quando trata de temas aparentemente banais, como o fim de uma dieta ou o drama de um torcedor gremista, há ali uma escuta atenta à experiência humana, um esforço em compreender as razões, os desejos e as falhas das pessoas. Em tempos de polarização e desumanização do outro, essa atitude é, por si só, um ato político. Sua literatura é um antídoto contra a brutalidade, porque resgata o valor da empatia, da delicadeza e do pensamento crítico.
Luis Fernando Veríssimo também é um mestre da concisão. Suas histórias curtas, muitas vezes compostas de poucos parágrafos, são capazes de sintetizar um universo inteiro em poucas linhas. Essa capacidade de dizer muito com pouco é outro sinal de sua sabedoria. Em um país em que a verborragia muitas vezes substitui a profundidade, Veríssimo nos ensina que o essencial pode — e deve — ser dito com clareza, sem rodeios nem excessos. E ao fazer isso com humor e elegância, ele transforma cada crônica em uma pequena aula de literatura e de humanidade.
Em epítome, chamar Luis Fernando Veríssimo de sábio e justo não é um elogio vazio. É um reconhecimento da sua contribuição inestimável para a cultura brasileira, não apenas como escritor, mas como pensador e cidadão. Sua sabedoria está em sua capacidade de enxergar o mundo com clareza, sem perder a ternura. Sua justiça está na forma como trata seus personagens, seus leitores e o próprio Brasil: com firmeza, mas também com empatia. Num país que muitas vezes parece carente de referências éticas e intelectuais sólidas, Veríssimo se destaca como uma dessas raras figuras cuja coerência entre pensamento, palavra e ação inspira e conforta.
Por final, justamente por isso que suas palavras seguem tão necessárias e tão profundamente humanas, e continuam conosco.
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