(Antonio Carlos “Bolinha” Pereira)
Sim, o “Maluco Beleza” esteve em Joaçaba. Fecho os olhos e imagino a cena, que poderia ter acontecido assim: o então jovem cantor, barbudo e cabeludo, rodeado por seguidores mais jovens que ele, empunha o violão, encara um dos rapazes e lhe diz, entre um copo e uma baforada: “Pedro, essa é pra ti”, e canta: “Muitas vezes, Pedro, você fala, sempre a se queixar da solidão. Pedro, onde ´cê vai eu também vou, mas tudo acaba onde começou”. Raul Seixas acende mais um, enquanto enchem seu copo outra vez. Alguém lembra que logo é hora do show, vamos lá, que hoje o Silveirão vai lotar!
Verdadeira multidão veio ver de perto o cantor, caravanas se deslocaram de Capinzal, Catanduvas, Curitibanos e outras cidades da região. O pessoal mais novo acha que é lenda, mas eu vi. Eu estava lá, naquele 19 de novembro de 1976, quando Raul Seixas fez um show vibrante, com o ginásio completamente lotado. O apresentador foi o radialista Ailton Viel. Gente em pé, gente no palco em torno dele, dançando suas músicas, cantando com Raulzito.
Após a apresentação ele me concedeu entrevista, apresentada no dia seguinte pela Rádio Catarinense, no programa “Os Discos do Bolinha”, que apresentei por 50 anos, com raridades da minha coleção de 3 mil discos de vinil.
Bolinha: Raul Seixas, você vai lançar um disco novo no fim do ano?
Raul: “É, o disco abre com a música “Eu Nasci Há Dez Mil Anos Atrás”, já lançada em compacto simples - o resto é tudo música inédita.”
Bolinha: Algum destaque especial nessas músicas novas?
Ainda emocionado com a reação do seu público, que ficou ali por mais de meia hora conversando e tirando fotografias com o ídolo, Raul detalha o conteúdo do bolachão:
Raul: “Tem uma que eu gosto muito, “Meu Amigo Pedro”, aquele amigo que você conhece de gravata, que tá num banco, começa: “ô rapaz, quanto tempo eu não te vejo”, e começa a dar aqueles conselhos, sabe, e eu peço a ele: “deixa eu viver a minha loucura, porque a loucura controlada é uma loucura segura”.
O aprendiz de repórter quer saber mais, porém evita falar dos problemas que a censura causou quando “sugeriu” alterações em várias letras (mais detalhes em http://www.osdiscosdobolinha.blogspot.com.br), e pergunta:
Bolinha: Mas me diga, dentro do panorama nacional, quem é que você destaca como gente de real valor na música jovem?
RS: “OK, bem, na música jovem, deixa eu ver... ó: a arte é o espelho social de uma época, certo? O que um cantor faz ele reflete o momento social que ele tá vivendo, se é um momento de plin, se é um momento de plan, ele tá plin, certo? Se não tá plan, ele plan! Você tá entendendo?”
Raul Santos Seixas nasceu às 8 horas da manhã em 28 de junho de 1945 numa família de classe média, na capital baiana. Seu pai, Raul Varella Seixas, era engenheiro da estrada de ferro e sua mãe, Maria Eugênia Santos Seixas, se dedicava às atividades domésticas. Em julho de 1945, foi registrado no Cartório de Registro Civil de Salvador com o nome do pai e do avô e em 16 de setembro batizado na Igreja Matriz da Boa Viagem. Em 1948 nasceu Plínio, o único irmão de Raul, com quem teve um bom relacionamento durante a infância. Começou a estudar em 1952, e em 1956 fundou o Club dos Cigarros com alguns amigos.
No ano de 1973, Raul lança seu primeiro álbum, “Krig-ha, Bandolo!” e alcança grande sucesso com “Ouro de Tolo”. Em entrevista à Folha de São Paulo declarou que a inspiração para compor a música teria vindo depois de passar uma tarde de "meditações e visões de um disco voador alaranjado".
A discografia de Raul Seixas apresenta 17 álbuns de estúdio, seis gravados ao vivo e quase 40 de compilações, além de inúmeros tributos lançados. Sua obra musical tem aumentado de tamanho, na medida em que seus discos continuam a ser vendidos, tornando-o um símbolo do rock do país e um dos artistas mais cultuados e queridos entre fãs de todas as idades.
Desde 2002, o nome de uma de suas canções mais famosas, "Maluco Beleza", é utilizada para dar nome a uma rádio em Campinas, feita por pessoas com problemas de saúde mental e usuários de drogas, voltada a reintroduzi-las na sociedade.
Na manhã do dia 21 de agosto de 1989, Raul Seixas foi encontrado morto sobre a cama, por volta das oito horas, em seu apartamento em São Paulo. A parada cardíaca foi consequência de uma pancreatite aguda fulminante, agravada pelo alcoolismo e pela diabete descompensada — Raul não havia tomado insulina na noite anterior.
Mas, ao contrário do corpo, a alma de Raul nunca foi enterrada.
Passadas mais de três décadas, sua obra segue viva, pulsando nas rádios, nos palcos, nos barzinhos e nas playlists das novas gerações. “”, “Metamorfose Ambulante”, “Gita”, “Maluco Beleza” e tantas outras canções continuam ecoando com força, provando que ele, de fato, veio para ficar.
Raul Seixas, com sua poesia rebelde e filosofia embaladas em rock, ainda conversa com quem ousa pensar diferente. Ainda inspira quem decide trilhar o próprio caminho. E ainda canta, lá do alto ou de algum outro plano, para quem quiser escutar.
Afinal, como ele mesmo disse:
“Sonho que se sonha só é só um sonho que se sonha só...
Mas sonho que se sonha junto é realidade.”
E Raul Seixas, este sim, é uma realidade eterna.
Então... TOCA RAUUUL!
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