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O TEMPO jornal de fato

Natal sem fome! E depois?

Prof. Evandro Ricardo Guindani Universidade Federal do Pampa - Unipampa

Neste momento do ano acontecem muitas campanhas para ajudar os pobres e famintos. “Faça uma criança feliz”; “Natal sem fome”; “Cavalgada do bem”; “Faça uma criança sorrir”; “Doar é amar”, e por aí vai...

Uma família rica vai ao supermercado, faz uma compra de dois mil reais, comprando carne, vinhos, espumantes e ao sair do mercado deixa lá para doação um pacotinho de biscoitos de três reais, e vai embora feliz porque está com a consciência tranquila, ou seja, fez a sua parte! Fez caridade!

A caridade inclusive leva o cristão a achar que está sendo bom cristão a fazer uma doação de alimento no culto ou missa de sua igreja...

Diante disso nos perguntamos: qual a função social e política da prática da caridade? Da doação, do voluntariado... Eu me arrisco a dizer que a função seja em contribuir para que a estrutura social não mude, que não se fale na causa da pobreza, apenas procure amenizá-la.

O sorriso de uma criança pobre ao receber um chocolate e brinquedo de natal, esconde ou ajuda o doador a esquecer e até questionar que nos outros 364 dias do ano, aquele rosto permanecerá triste e com fome.

Por isso, entendo que a prática da doação, da caridade contribui para despolitização e descomprometimento com a transformação da sociedade.

Que tal fazermos outras ações? Projetarmos em grandes telões de nossas cidades as fartas ceias de natal nas mansões do Brasil afora, as comilanças e bebedeiras de espumantes caríssimos, as viagens a resorts e ao exterior realizadas nas férias de final de ano. E em outro telão colocar famílias catando lixo e as sobras dessas comilanças no dia 26 de dezembro e 01 de janeiro.


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De acordo com dados do IBGE, em 2023, os 10% da população brasileira com maiores rendimentos domiciliares per capita tiveram renda 14,4 vezes superior à dos 40% da população com menores rendimentos (Fonte: Agência Brasil – EBC, 2024).

Esses dados alarmantes nos fazem entender que o problema do Brasil, não é uma família ter 8 filhos e não poder sustentar, mas sim, uma família gastar com um filho o que poderia sustentar 14. Esse é o problema que não aparece quando são realizadas campanhas de doação de alimentos, roupas, sopão para moradores de rua, etc....

Não quero aqui tirar a beleza da solidariedade, da ajuda mútua, da compaixão, da fraternidade... Porém isso seria muito melhor se fosse praticado entre os iguais, como aquelas famílias do meio rural que matam um porco e levam um pedaço de carne ao vizinho, sabendo que depois receberá também.

O problema da caridade que assistimos é que ela faz com que o rico não se sinta privilegiado e tenha consciência tranquila, não reflita sobre a desigualdade de renda, e faz com que o pobre se sinta envergonhado e agradecido pela migalha que recebe, e assim seguimos o próximo ano, sempre assim...

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